quarta-feira, 1 de junho de 2011

FALTA FÔLEGO À INICIATIVA DE FAZER COM QUE A POPULAÇÃO ENTREGUE ARMAS DE FOGO

Lançada há duas semanas na esteira do massacre de Realengo, onde 12 crianças morreram baleadas por um atirador que adquiriu armas no mercado ilegal, a campanha do desarmamento funciona na base do improviso. Nos primeiros 15 dias de mobilização, foram recolhidos 1.097 armamentos no país, dos quais cerca de 500 só pela ONG Viva Rio, parceira institucional do governo federal na empreitada. Os números, passados pelo coordenador da entidade, Antonio Rangel, apontam uma média de 73 armas devolvidas pela população por dia. Caso esse ritmo se mantenha, a campanha chegará ao fim, previsto para 31 de dezembro, com 16.070 peças retiradas de circulação. Mesmo pagando por artefato recebido o valor máximo da indenização, que varia entre R$ 100 e R$ 300, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, só conseguirá gastar R$ 5,1 milhões. O valor equivale a pouco mais de 50% dos R$ 10 milhões que ele reservou no orçamento da pasta para os ressarcimentos.

Além dos dados desanimadores, que o governo se nega a divulgar oficialmente, a campanha publicitária, com narração do ator Wagner Moura, ainda não foi ao ar. Até agora, apenas os postos da Polícia Federal, que desde 2008 nunca deixaram de atender o cidadão que quisesse entregar armas, estão recebendo os artefatos. Uma portaria publicada na última quarta-feira definiu os critérios para outras forças de segurança — como a Polícia Civil e as guardas municipais — se credenciarem. Quanto à participação de organizações não governamentais, igrejas, escolas e outros parceiros, apontados pelo ministro Cardozo como fundamentais na campanha do desarmamento, as regras sobre como poderão atuar só sairão em 15 dias. A Viva Rio é a única entidade com esse perfil que já recebe as armas, em virtude de ser parceira da campanha.

Rangel, coordenador da entidade, reconhece o atraso nas ações primordiais da mobilização. “Houve um descompasso entre o lançamento da campanha e essas providências práticas. Por isso mesmo, achamos que não valia a pena colocar a propaganda no ar enquanto o sistema de coleta das armas não estivesse bem estruturado”, afirma o especialista. Melina Risso, diretora do Instituto Sou da Paz, que também apoia a iniciativa, destaca o sistema de indenização em 24 horas — uma novidade da campanha deste ano em relação às realizadas anteriormente — como o principal motivo de atraso. “Quanto ao resto, não estamos começando do zero. Mas, no que diz respeito ao pagamento, sim. Então, é preciso capilarizar essa estrutura para, só depois, fazermos uma avaliação definitiva. Independentemente disso, achamos importante fazer o lançamento aproveitando o fato de Realengo como algo simbólico”, defende. O Ministério da Justiça foi procurado pela reportagem, mas não respondeu aos questionamentos.

Irrisório
Presidente da ONG Movimento Viva Brasil, Bené Barbosa é crítico contumaz da política de desarmamento. “Esse número irrisório prova o que já vínhamos falando há tempos, de que não há adesão popular por dois motivos. Primeiro porque quem tinha arma para entregar já o fez e segundo porque as pessoas estão cada vez mais inseguras”, afirma Barbosa. Segundo ele, a população anseia por outras ações de combate à violência, sobretudo na diminuição da impunidade. Melina, do Sou da Paz, considera “prematura” a ideia de que o estoque de armas em poder da população que se sensibiliza com uma campanha como a atual já foi esvaziado. “Na nossa concepção, cada arma que é retirada de circulação e destruída vale a pena. Temos que oferecer ao cidadão que quer se desfazer do objeto mecanismos legais, eficientes, de fácil acesso e seguros”, rebate a diretora da ONG paulista.

Para Mendonça Prado (DEM-SE), presidente da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado da Câmara dos Deputados, campanhas de desarmamento são uma parte muito pequena das políticas de enfrentamento à violência. “Nosso Estatuto do Desarmamento é uma legislação quase perfeita, o problema é que muito pouco do que está lá é cumprido. Embora haja critérios rígidos para a permissão de ter arma, qualquer pessoa consegue uma hoje de forma ilegal”, diz o deputado. Ele defende reforço na segurança das fronteiras e o aumento de fiscalização. “Campanha de desarmamento não pode ser um marketing. Recolher cerca de mil armas em um país do tamanho do Brasil é ínfimo. A retirada de armas se faz em blitze, em patrulhas policiais, em revistas. Mas como fazer isso se chegamos a municípios com 30 mil habitantes onde há dois soldados?”, questiona.

A desejar
O lançamento oficial da campanha do desarmamento, quando a chacina de Realengo completou um mês,
não se traduziu em ações concretas. Veja o balanço dos primeiros 15 dias da iniciativa:

1.097 Número de armas entregues no Brasil até a última sexta-feira
500 Quantidade de armas entregues só ao Movimento Viva Rio, na capital fluminense
73 Média de armas entregue diariamente nas primeiras duas semanas de campanha
16.070 Número total de armas que serão recolhidas até o fim do ano, se mantido o ritmo atual
459 mil Quantidade de armas recolhidas na campanha de 2004/2005
35 mil Quantidade de armas recolhidas na campanha 2008/2009.

Fonte: Correio Braziliense (edição de 22.05.2011, www.correiobraziliense.com.br).

NOTA: "O Clube de Tiro de Mossoró não estimula o armamento da população, apenas posiciona-se contra a tentativa de ferir o direito do CIDADÃO DE BEM de possuir uma arma devidamente legalizada em sua residência”.

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